segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

                                  Janelas...
                               

                                entre soleiras
 de todas as casas,
                                são quadros
                                pendentes
                                abrindo
                                o azul.  
 E captura
 o que quase
 se move
 livremente.
 Por elas
 passam nuvens
 passa o sol,
 passam folhas,                     
 dançam réstias.



Janelas são olhos
da minha casa   
E me trazem pardais
                               Trazem  ecos
e me servem sonhos
                               em bandejas
                               de lembranças...
                               café com leite,
e pãozinho
                               ancoram no porto
desta  manhã
com promessa  
                               de calmaria ...

e eu tomo  café
                               em boa companhia

domingo, 15 de janeiro de 2012

palavras amontoadas

PALAVRAS  AMONTOADAS                        


Quero sempre baralhar palavras
Jogá-las a sorte
Nem que sejam ermas, esmas, vadias,
A dizer poucas cousas sensatas,
Ou por puro dizer coisas.
Ou que sejam frias, gélidas, pina-colada
A correr da caneta em desatino,
Como um rio corre para o mar,
Serpenteando entre margens fofas de impedimentos

Palavra-vil , banalizada, execrada, lesada,
Pela incompetência, ineficiência e arrogância,
Pelo sim dito à escuras, às pressas
Encobertas por nefandos ardis,
Ou um não dito à tona de meias verdades.

Quero palavra -riso, sorriso, gargalhar escancarado,
O escancarar de portas, de janelas, de frestas
Deixando passar o tempo, no vento
A fantasia de dias melhores, serão piores
Na ótica dos aflitos e dos insensatos.

Quero a palavra-chave dos segredos
Segredado em muros, em murais.
No chão escrita a giz, na alma escrita a mão,
Fluindo sem receio, a passeio, a caçoar do medo
A zombar da indiferença , em seu traje de gala.

Quero a palavra-som, o som dos gritos,
A ecoar nos outeiros, nos travesseiros,
Ser ouvida no mais ermo dos recantos
Ou trazendo o mais doce dos encantos,
E, trazer vida, a qualquer vida,
numa canção inesquecível a ser ouvida

Quero a palavra-certa para horas incertas,
palavra ungüento, para qualquer mal de amor
Nos momentos de perda e de dor.
O desespero encontre guarida  à sua sombra
E todos contentes sejam felizes para sempre

 Pode ser a palavra-vã, que nada diz,
Mas preenche espaços em platéias vazias,
De mentes vazias, mãos vazias,
A toa,vagabunda, ordinária, vadia
Quero a palavra bela, que torne belo o meu poema,
Só não a quero muda.
                                   Dulce Dez-2003

sábado, 14 de janeiro de 2012

cantemos a luz

As rugas são ruas de saudades,
Cada sulco no rosto foi caminho
Da dor e da tristeza, da perda e do ganho.
E tambem do sonho
Cada sulco abrigou as alegrias
Em detrimento às mágoas,
Abrigou a mágoa
Não em detrimento, mas ombreando-se.
A um punhado de coisas boas,
que não dá para se desprezar.
Uma troca em que ganhamos mais?
Em que perdemos menos?
Deu empate técnico.
E,a voz, não mais forte, 
Deixa hoje no ar inúmeras certezas,
Incontáveis dúvidas
Infinita lacuna entre a dúvida e a certeza.
Não choremos a saudade de ruas estreitas
Enleada em sua própria sina...
Mas cantemos a luz 
Que se difunde infinitamente
Num ponto qualquer da vida
E simplesmente  nos fascina



terça-feira, 10 de janeiro de 2012

refletindo, relutando,reluzindo





vaguei na areia,
                    e transpus para cada grão
                   o que se esvaía completamente
pelos dedos.
                   enfim o que  seria de mim,
 um grão de areia,
atado á mirabolantes sonhos,
que nunca sabiam cerceados.

Erguer-me-ia do nada
Bateria o que feito poeira
 rodopiava o meu redor,
 relutaria,
reluziria  
E me negaria veementemente ,
ser a parte inanimada das colinas,
e  ser só uma montanha,
incrustada na paisagem,
pendente do azul,  
apagada em si mesma...

sábado, 7 de janeiro de 2012

gotas de palavras


  Em "gotas de palavras"  hoje nós temos 
     Cora Coralina





Não sei...
Se a vida é curta
Ou longa demais pra nós,
Mas sei que nada do que vivemos
Tem sentido, se não tocamos o coração das pessoas.
Muitas vezes basta ser:
Colo que acolhe,
Braço que envolve,
Palavra que conforta,
Silêncio que respeita,
Alegria que contagia,
Lágrima que corre,
Olhar que acaricia,
Desejo que sacia,
Amor que promove.
E isso não é coisa de outro mundo,
É o que dá sentido à vida.
É o que faz com que ela
Não seja nem curta,
Nem longa demais,
Mas que seja intensa,
Verdadeira, pura...
Enquanto durar
Cora Coralina
Picture by Max

a orquídea e o orvalho

É tarde
O poema nasceu velho.
Filho temporão
Escapou da prisão,
Desviou-se das soleiras,
Preferindo escalar  janelas,
Chegou cansado.
Depois de ter percorrido
 tantas luas,
Umedeceu os cabelos nas gotas de orvalho -
De tantas, que os embranquecera
No corrosivo líquido cristalino do tempo.


Os versos
 não se deram conta
Do menino que os acompanhou
E envelheceu com eles.
Quando  menino não sabia:
      dos ocasos
      dos erros
      das lendas
      decifrar enigmas
      desconhecia as    
                borboletas
               e os bem-te-vis
                             
não entendia o pensar das madrugadas,
Não sabia da primavera numa única flor,
A orquídea, era só um mito inatingível.
E a vida, uma forma imutável de viver

                  Dulce 2004

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

bacia de cerejas


O Valioso Tempo dos Maduros
Contei meus anos e descobri que terei menos tempo para viver daqui pra frente do que já vivi até agora.
Tenho muito mais passado do que futuro.
Sinto-me como aquele menino que recebeu uma bacia de cerejas.
As primeiras, ele chupou displicente, mas percebendo que faltam
poucas, rói o caroço.
Já não tenho tempo para lidar com mediocridades.
Não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflamados.
Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem eles admiram,
cobiçando seus lugares, talentos e sorte.
Já não tenho tempo para conversas intermináveis, para discutir
assuntos inúteis sobre vidas alheias que nem fazem parte da minha.
Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas, que apesar da idade cronológica, são imaturas.
Detesto fazer acareação de desafetos que brigaram pelo majestoso cargo de secretário-geral do coral.
'As pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos'.
Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos, quero a essência,
minha alma tem pressa...
Sem muitas cerejas na bacia, quero viver ao lado de gente humana,
muito humana; que sabe rir de seus tropeços, não se encanta com
triunfos, não se considera eleita antes da hora, não foge de sua mortalidade,
Caminhar perto de coisas e pessoas de verdade,
O essencial faz a vida valer a pena.
E para mim, basta o essencial!
Mário de Andrade
(1893-1945)